quarta-feira, 25 de junho de 2008



"Acredito, sim, em inspiração, não como uma coisa que vem de fora, que "baixa" no escritor, mas simplesmente como o resultado de uma peculiar introspecção que permite ao escritor acessar histórias que já se encontram em embrião no seu próprio inconsciente e que costumam aparecer sob outras formas — o sonho, por exemplo. Mas só inspiração não é suficiente".

segunda-feira, 23 de junho de 2008

POEMA DE ANIVERSÁRIO


Sei que minha existência representa um fardo pesado pro mundo,
E se não mudo, é justamente por ter essa consciência,
De que desagrado e incomodo e difiro e contesto,
E estou sempre à margem,
À margem desse lamaçal de mentira, medo e ódio.

No meu caminho há flores, que poucos enxergam,
Há leveza e beleza suficientes para torná-lo mais ameno.
Há fé e esperança, que tornam meu semblante menos grave,
E me fazem destoar do restante dos transeuntes.

Porque para mim, a vida soa urgente e viva,
E não há nela lugar para protocolos e burocracias.
Esse espaço todo está devidamente preenchido pela poesia,
Minha poesia pobre, livre e tão necessária a minha humanidade.

Estou cercada e alicerçada por crenças infantis aos olhos do mundo,
Esse mundo adulto, adulterado, que não me apetece em nada,
Com suas dúvidas eternas e filosofias delirantes,
E todas as dores que estas lhe trazem...

Tenho dores também, às vezes elas são necessárias,
Mas em contrapartida, tenho antídotos e bálsamos em minha alma.

Entendo a vida, repudio a existência.

Sobrevivo ao caos, como o sol,
No seu exercício diário de pontualidade e benevolência.

Sofro de um tipo raro de esquizofrenia chamado poesia,
Jamais ousei buscar sua cura,
Esse constante estado diverso de beleza e consciência crítica
Que ela me proporciona
É tudo quando mais desejo.

Logo, aceito meu fado de doente crônica com um prazer absurdo,
E sigo vivendo, não apenas existindo, nesse nosso mundo de absurdos.

Viver implica dizer não ao conformismo:
- Sim, eu vejo flores nascendo no asfalto!

domingo, 15 de junho de 2008

Festa Junina

Entre bandeirinhas coloridas, que não me remeteram o pensamento confuso a Volpi, conversas, risos, singelas explosões e muita gente, Adoniran Barbosa aliviou meus ares. Arrisquei até acompanhá-lo, cantarolando baixinho o Samba do Arnesto. No mais, a noite era só uma promessa, iluminada por luzes e alegria artificiais, regada ao som estridente das bombinhas que estralavam, tocando o chão furiosamente. E as crianças correndo, pisando as flores, ainda há pouco plantadas nos canteiros da praça. A cidade vai aos poucos sendo reviltalizada, estamos às vésperas da eleição...
E o prefeito, sorridente, caminhando entre os presentes, a mão estendida a todos, abraços, beijos, promessas... Fingi não vê-lo.
Ouvi conversas que falavam sobre traição e risos.
Queria um doce. Olhei pra fila do caixa, enorme, como toda fila o é por essência. Enorme de um lado só... Estranho, por que aquela aglomeração, se do outro lado atendia-se da mesma forma? Não entendi, aliás, não entendo mutias coisas.
Pro doce, não precisava comprar ficha. Foi o que fiquei sabendo, tão logo cheguei ao guichê.
Na barraca, enfeitada com flores de papel colorido, impressionaou-me a destreza da senhora que atendia. Fazia-se notório o fato de que ela, habituada a ser servida, não tinha nenhuma intimidade com os talheres. Nessas festas, ao menos nelas, alguns papéis se invertem. Normalmente, são senhoras da "high society", que atendem nas barracas, atendendo a uma espécie de chamado espiritual, afinal, tudo que se arracada nelas é revertido às causas da Igreja.
Hilária a cena da madame brigando com a espátula...
No mais, a festa não mudou meus ares. O doce não adoçou minha existência esdrúxula. E a música de Adoniran foi só um respiro, necessário respiro.

sábado, 7 de junho de 2008

Alma

Um varal onde você pendure seus sonhos,

Sem a necessidade da amarra de prendedores,

Que o vento não é tão forte a ponto de derrubá-los,

E a brisa apenas os impulsiona,

Projetando-os à frente.

Nem o sol tão quente a ponto de ressecá-los,

Fazendo-os perder o viço,

Mas quente apenas o necessário para torná-los fecundos.

E que o varal se estenda desde o princípio daquilo que afirmamos conhecer,

Até a fronteira com a eternidade,

Para que o mundo seja repleto das cores e da leveza dos sonhos,

Avolumando-se delicadamente

Nesses varais flutuantes

Que chamamos alma.