sábado, 24 de janeiro de 2009

BRINCADEIRA DE MENINA

Brinco com as palavras desde sempre,

As bonecas... as fazia de papel pra minhas idéias ainda disformes,

Mas já insanas.

E que papel macio...

A caneta deslizava louca,

Pela borracha cheirosa.

Riscava tanto e com tanto gosto,

Como nem Camões fizera ao escrever “Os Lusíadas”.

Podia mesmo passar horas assim,

Entretida nesse lúdico exercício de menina-escritora.

É de pequena também

Que minhas palavras assustam,

Qual era a reação dos maiores ao verem minhas bonecas,

Com suas faces, antes róseas e delicadas,

Agora tomadas pelo multicolorido feroz de meus traços...

Hoje, desvencilhada das bonecas,

É o papel quem sofre a violência esdrúxula de meus traços

E ainda são muitos os que se escandalizam com eles.

Coitados... Ignoram por completo o fato, aparentemente claro,

De que sou só uma menina, uma menina crescida, que ainda brinca com as palavras...

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

"Não é no progresso material que se esgota a minha utopia.
É no progresso espiritual como expressão mais radical de nossa plena humanidade".

FREI BETTO

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

O Reino Numeral

Ouço notícias da Palestina,
E meus ouvidos, pouco receptivos a notícias,
Ainda assim se escandalizam de dor.

As pessoas são números estatísticos
E isso me agride bastante,
Porque os números sempre me causaram sensação de distanciamento e frieza.

Porque os números...
Os números não nutrem esperanças,
Nem são dotados deste músculo essencial chamado coração.

Não, os números não se despedem daqueles a quem amam,
Com beijos, ao sair, logo pela manhã.

Não, eles também não temem a incerteza do retorno seguro ao lar,
Eles não ouvem o "tchau" dos filhos,
Com aquele amável grito estridente,
Que só as crianças sabem emitir.

Os números... Os números não amam,
Os números não odeiam.

Não se personificam,
Nem tão pouco os seres humanos por eles representados
Podem regredir, vergonhosamente a esse seu estado numeral...
Isto jamais!
Porque, ainda que sejam infindos,
Neles jamais caberiam todos os sonhos,
Medos, alegrias, angústias e desejos
Que acalentaram, aqueles de quem o estado numeral decreta,
solenemente, nos telejornais burros,
a morte.

Talvez a morte seja mesmo,
Ao menos para os mais insensíveis,
O triunfo dos números,
A instauração do Reino Numeral...

A estrela e a cruz...

Eu, particularmente, as inverteria em minha lápide,
Que a vida, às vezes é fardo,
Enquanto que o morrer é alento de felicidade eterna.

...

A caneta quase que se nega a registrar este último verso,
Contudo, há necessidade de encerrar esse poema com ele,
Ou, seria mais adequado, com ela,
Esta pergunta que se lhe apresenta assim,
Grave, fria e mortal:
- Quantos, quantos teriam morrido desde o início de sua escrita
até este desfecho esdrúxulo?
Quantos?

NÚMEROS...