sábado, 23 de fevereiro de 2008

Adiós, Cuba livre?

Transeuntes apressados, carregados de sacolas, cujos dizeres “30% off”, lhes dão uma enorme sensação de satisfação. Nos pés, unânimes Nikes idênticos... Última moda.

Carros enfileirados em longos, intermináveis engarrafamentos, úteis apenas às empresas que desfilam seus produtos às vistas cansadas dos motoristas em outdoors.

Banners, faixas, panfletos, folhetos, cartazes, uma miscelânea de apelos ao consumismo. Poluição visual.

Fast-foods, milhares deles, espalhados estrategicamente por toda a extensão da ilha.

Estamos em Cuba. Sim, em Cuba, e não em Nova Iorque.

Quanto me custa traçar a descrição, ainda que resumida, desse cenário, por dantesco que é.

O fato é que o comandante despediu-se oficialmente. Fidel Castro reconheceu não gozar mais de condições físicas para exercer o comando da ilha. Despediu-se do cargo, não do poder. Aliás, essa palavra parece estar irremediavelmente ligada à sua figura. Ele o exerceu por cinco décadas. E agora, privado do vigor físico, de que gozava quando da tomada do poder das mãos de Filgêncio Baptista, ao lado do companheiro Che, Fidel continuará, até o último momento a exercê-lo. Quanto a isso, não há dúvidas.

O que inquieta é cogitar o futuro de Cuba após sua morte, e diante do anunciado esta semana, essa inquietação ganhou ares de iminência.

Não vou discutir aqui a qualidade do governo de Fidel, apesar de serem absolutamente perceptíveis em meu texto minhas opiniões acerca do mesmo, nem tampouco a validade da Revolução, assunto corrente esta semana, mas sim o futuro da ilha. Seria ele yankee? Maldito capricho dessa deusa melindrosa chamada História, a quem nutrimos com nossas esperanças e desalentos transformados em ações, que culminam vez por outra em acertos ou derramamento de sangue!

Maldita intromissão imperialista, sempre pronta a “ajudar” a restabelecer a ordem, livrando os oprimidos de seus algozes, ainda que estes não se sintam oprimidos, nem enxerguem seus líderes como algozes...

Os redentores pós-modernos já citam Cuba em seus discursos, aliás ela passou a ser uma espécie de divisor de águas entre os candidatos às prévias eleitorais americanas.

Seria a bancarrota do último reduto socialista das Américas? O triunfo do capitalismo? A volta dos cubanos de Miami, dispostos a construir uma nova Cuba aos moldes estadunidenses?

O que, há pouco tempo atrás soaria como improvável, absurdo, assume agora ares de possibilidade real.

E eu ainda não consegui visitá-la... Demoro mais um pouco e vou ter que engolir a contra-gosto o lanche sonso dos fast-foods, acompanhado de uma Coca-Cola gelada, enquanto contemplo os novos capitalistas às compras, no revitalizado centro de Havana.

E me pergunto, estão eles livres agora? Se a liberdade era pelo que mais ansiavam, estão livres agora? O capitalismo trouxe a tão idealizada liberdade?

A sombra do algoz já não soa tão pesada sobre seus ombros? Qual é a bandeira que tremula na Praça da Revolução? Eles sentem por ela alguma espécie de devoção patriótica?

Livres para a selvageria das leis de procura e oferta, da livre concorrência? Livres para excluir as maiorias, marginalizando-as? Livres para verem-se lesados em seus direitos mais essenciais, como a saúde, a educação? Sim, porque é isso que o sistema capitalista costuma trazer camuflado por detrás de suas idéias de liberdade. Contradições que acabarão por destruí-lo, como diria Marx.

Contudo, a Marx e toda a sua influência no pensamento político, assim como a Fidel e sua ilha parecem ter sido legados lugares menores, por antiquados que são em face da “esplendorosa solução” das cartilhas capitalistas e neo-liberais. Uma pena!

A História seguirá contando a versão dos poderosos, continuará mal contada. E Cuba? Nova colônia estadunidense? (Só a simples formulação desse conceito soa cruel e injusta demais). Mas se assim acontecer: ADIÓS, CUBA LIBRE!

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