domingo, 6 de abril de 2008

CHE


Ele já morreu?
Não. Suponho que não.
Mesmo? Tem certeza?
É só ver. Suas pupilas não estão dilatadas ainda.
E a respiração?
Está leve.
Quando ele vai morrer?
Posso eliminá-lo, senhor?
Breve.
Não fique assim, não, eu lhe asseguro que vai morrer.
Certo, estou mais calmo, aliás, o que ele fez?
Ele?
Sim.
Ele nasceu, teve infância, um lar, pai e mãe
Alguns irmãos.
Depois?
Cresceu, comprou roupas e uma moto com o suor do seu rosto,
teve dois trabalhos.
Depois?
Leu alguns livros, se interessou por uma garota.
Depois?
Pensou ter visto a liberdade numa esquina da cidade.
Depois?
Aprendeu apesar de tudo
que nos corpos ainda resta alguma liberdade
sem esquinas e sem cidades.
Palavra perigosa esta.
Concordo, muito perigosa.
Olha, parece que resiste.
É necessário que ele morra.
Sim.
Está na hora.
E mal lhe eprguntando,
qual foi seu último pedido?
Fazer uma poesia.
Que desperdício de pedido, poesia,
merece morrer mesmo.
Concordo plenamente.
Tem ela aí?
Queimei-a com suas roupas e pertences.
Você é muito competente.
Obrigado, senhor, bondade sua.
Olha, passa da hora, mate-o!
Posso?
À vontade.

Pronto.

E o corpo?
Enterre-o no jardim de casa
Minha mulher sempre reclamou da falta de adubo das hortências.

Nestor Lampros.




Um comentário:

Ana Raquel Fernandes disse...

Um lindo presente do poeta e amigo Nestor Lampros... Dos tempos da faculdade, talvez inspirado em minhas camisetas... Rsrsrs