segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Mera reflexão

Sucesso antes mesmo da estréia, “Tropa de Elite”, merece muito mais que críticas e ou elogios. Merece reflexão. É o que pretendo fazer nesta coluna, sem nenhuma pretensão à crítica de cinema, mas com a necessidade urgente de incitar reflexões.

Escolha inglória entre corromper-se ou ir à guerra. O sistema não deixa nenhuma outra alternativa além destas duas.

Por esse motivo, e só por esse motivo, “Tropa de Elite” merece ser assistido, porque sugere uma profunda reflexão sobre as engrenagens desse nosso sistema enferrujado e capenga. Não com o intuito e com a expectativa bruta de maravilhar os olhos descrentes, com cenas violentas, apenas. Se bem que essa expectativa é até compreensível, tamanha é a indignação da população diante dos desmandos do crime organizado.

Contudo, o filme propõe uma reflexão nada superficial, em nada baseada em conceitos práticos, alicerçados no rancor e no sentimento de impotência da sociedade. Além disso, sua crítica não se limita à corrupção no meio policial, não ao menos, ao meu ver.

Ao tratar tão abertamente da questão, seu enredo acaba por denunciar toda e qualquer forma de corrupção, aconteça ela em qualquer meio.

A corrupção é um mal que, infelizmente, não se limita ao meio policial, aliás, ela só se instaurou nele, em função de haverem outras tantas formas, em outros tantos meios, tão ou mais desprezíveis que esta. Talvez fosse possível remunerar melhor nossa polícia, se não existisse, por exemplo, a corrupção que faz evaporar dos cofres públicos milhões, constantemente.

Mais exemplos? Basta rever nosso passado (sempre presente) político. Em suma, nossas instituições, todas, sem exceção, alicerçam-se desgraçadamente nessa prática fraudulenta.

Terrível dizer, mas parece mesmo que as instituições tornaram-se dependentes da corrupção de tal forma, que aniquilando-se ela do seu seio, ela sucumbiria. A corrupção parece ter sido o meio encontrado pelas instituições para sobreviver... indignamente. Terrível, mas real.

Já o filme não me pareceu tão terrível assim, como pintaram alguns, digamos, mais sensíveis, ou seria melhor dizer, insensíveis, porque se negar a assistir à realidade, ainda que em formato ampliado, é uma insensibilidade. Suas imagens e textos não diferem muito daqueles aos quais assistimos diariamente nos telejornais.

A morte assumiu ares de número. Mero dado estatístico. E há de se desconfiar até mesmos destas senhoras distintíssimas: as estatísticas, visto que a corrupção já a alcançou há tempos, e ela não aprece mais testificar outra verdade, se não aquela que se faz conveniente a alguém.

Agora, imaginar que o referido filme seja um elogio à brutalidade ou um ataque feroz e leviano à polícia é, no mínimo, equivocado. O “generalizar” é sempre um equívoco.

O fato é que nele, realidades supostamente contrárias entre si, se fundem, se assemelham. A opção do policial pela honestidade é a mesma do menino que nasce no morro, cercado pela miséria, e ainda assim, não se corrompe. Ao passo que a opção do policial corrupto é a mesma do menino que vira trafiacante.

Opções...

O fato é que o sistema não nos deixa muitas.

Mais que um sucesso de bilheteria ou de crítica, meu anseio sincero, e acredito que também o seja o de seu diretor, é que “Tropa de Elite” incite a uma reflexão complexa e profunda acerca de nossas instituições e do sistema que as gerencia e mantém, ainda que cancerosas e decadentes. Ainda que corrompidas. Aliás, a corrupção serviu desde sempre aos interesses desse sistema.

Mais que criticar policiais ou bandidos, sua função é causar um verdadeiro reboliço nas mentes pensantes dessa nossa sociedade, já que é ela quem os cria, bandidos ou policiais. E quando esses dois termos tão distintos se confundem, é porque já é passada a hora de rever o funcionamento de todo um sistema.

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